Sabem qual é coisa mais poderosa na dor?
É olhá-la nos olhos e saber que nao nos mata. Que nos come as entranhas como se ácido as corroe-se, que nos corta a respiracao enquanto continuas a respirar. Mas que naquele restiozinho de fólego que te deixa vir ao de cima, sabes, tens a certeza, que não é disto que morres.
Mais depressa te esfalfas contra um muro de tanto passar sinais vermelhos, de tao turva que vai a vista ou distante a mente. Mas disto nao morres.
Podes berrar, chorar, cair de exaustao quando ja nao há puta de lagrima que role. Mas acordas todos os dias. E o que lá estava ontem, e há 3 ou 4 meses, continua lá. E tu sabes. E mais gente sabe. Quase como um culto, um pacto de silencio, que nao se fala nem se discute, salvo raras excepcoes.
E a verdade tem um poder do caralho. Liberta. Desturva. Limpa.E perguntas te como foi e onde estava que eu nao vi. E carregas no rewind dezenas, centenas de vezes. E procuras, procuras e nao vês. E analisas cada palavra, cada gesto, cada olhar. De meses. De anos.
E diz me ele, procuras uma agulha no palheiro (aparte: a expressao é a mesma em português e ingles). Tentas fazer sentido de algo que nao o tem. Tentas por-te nos pés de alguem com um mind set completamente diferente do teu. Eu mais a puta da mania da empatia. Esquece lá isso. Diz ele. E volta a dizer me o que me anda a dizer ha 3 meses. Foi feito para tu nao veres. É mesmo assim. Faz parte.
E lês, investigas, procuras, e achas gente parecida. Com o mesmo tipo de "estória". Há sempre um conforto estupido quando encontras desgraçados pela mesma desgraça que tu. É quase um sentido de pertença. Negro como a noite escura, mas de pertença. Triste e podre. Mas é a tua desgraça e a desgraça deles.
E no fundo da dor, há uma logica. Há uma sanidade. Há uma força. Aquela não é mais a tua história. Saiste. Escapaste. Não és, nem nunca mais serás, a mesma pessoa. E ainda bem.