Há dias em que me lembro de ti. Nao que aconteca muitas
vezes. Nao por ser 5 de Outubro e ter algum significado
revolucionário. Só porque me lembro de ti. Verdade seja dita, lembro-me mais
dos miúdos. De como estarao crescidos e diferentes. Pergunto-me se se lembrarao
de mim (sim, eu sempre tive uma ponta de egocentrica). Pergunto-me se o G.
continua louco por animais, a escrever cartas de amor como as que me escrevia a mim e esquisito para comer e a L. princesa como só ela, com apetite de camionista e a correr com os pés para fora, como tu. E tomo consciencia de que aprendi a viver sem
os abracos ternos deles, os sinceros “adoro-te” e com a ausencia de noticias sem que
doa. Já nao faz mal.
Em que mais penso? Que a mágoa passou. Que há muito tempo
que deixou de doer e fui á minha vida como tu foste a tua. Nao penso nas coisas
más. Penso que te perdoei. Quer dizer… mais ao menos. Perdoei-te por mim. Nao
pela minha cria. O instinto maternal leva-me a confessar que nunca te poderei
perdoar nesse flanco.
Mas o bom é que hoje consigo pensar no que aconteceu sem que
pareca que o meu mundo desabou. De que nao havia luz ao fundo do tunel. Foi o
que senti durante muito tempo. Mas, como tudo, passou e há muito que deixou de
doer. Nao deixou de doer hoje. Aconteceu há uns anos atrás. Deixou de doer no dia em que deitei fora todas as cartas, todos os presentes, todas as fotos e lembrancas que tinha vossas. Num saco cheio de pedacinhos de papel, pedras, anéis de arame e flores secas deitei fora tudo o que sentia.
Mas hoje, ao ouvir
uma musica que me lembrou de ti, tomei consciencia do que sinto.
Há muito tempo que me deixei de analisar o que aconteceu, os
porques, as hidden agendas por detrás de tudo o que se passou. Nao foi bonito,
foi triste e negro. E tentar percebe-lo matou-me por dentro durante o que, para
mim na altura, pareceu uma eternidade.
Lembro-me da última vez que ouvi a tua voz. A
desmarcar pela terceira vez um encontro em que me prometeste explicar tudo. Era
Verao. Corria o ano de 2009. E já nessa altura, tinha deixado de ser
importante.
Sempre te disse que no dia em que me quisesses explicar já
nao iria ter importancia. Eu sempre tive umas premonicoes jeitosas. Talvez o
instinto desconfiado e as facadas nas costas que tenho levado por aí ajudem.
Nao quero apontar-te o dedo e despejar a lista de defeitos
que tens ou tiveste. Nao quero acusar-te e dizer-te onde erraste e o tamanho do
buraco que fizeste no meu peito. Escrevi tudo o que me passou na alma na altura.
Ofendi-te com todos os palavroes do diccionário. Insultei-te de tudo o que
me ocorreu, porque para mim todos te acentavam como uma luva. Fiz-me de stalker e
assaltei-te a caixa de e-mail e descobri alguma "verdade".
Nao me orgulho de o ter feito, mas tambem nao me arrependo. Mil vezes a verdade
que dói á mentira que se camufla de felicidade. Mas adiante. Eu sei. Tu sabes. E
sarou.
Nao deixei de acreditar no amor por tua causa (ok, durante
uns tempos, deixei) nao fiquei incapacitada para o resto da vida ou ferida de
morte. Levou tempo e nao foi de caras. Levou horas de psicanálise barata, até
de madrugada. Levou drogas fortes que me fizessem esquecer. Levou abracos e ombros
de gente que ainda hoje te odeia de morte.
Mas um dia, nao sei qual, nem o mes, nem o ano, acordei e
nao doía. Nao pesava lembrar-me de ti. E hoje apeteceu-me escrever sobre isso.
Porque sei que me les? Talvez sim, talvez nao. Nao é importante. Porque me
apeteceu. E eu sempre fui assim. De apetites. De fazer o que me apetece. Sem
pensar, sem reflectir. Eu sempre fui mais coracao que cabeca. Mais emocao que
razao.
E hoje a razao é que sou feliz. Longe, muito longe. Deu um trabalhao do caracas, envolveu emigrar e mudar a minha vida toda. Com um medo enorme que tudo voltasse a acontecer. Que um dia ele fosse uma cópia reles do que tu foste. Mas nao é! Nao lhes chegas á sola do sapato, quanto mais aos calcanhares. Diria "sem ofensa", mas ía parecer falso.
Vale a pena cada vez que respiro. Feliz com as letras todas. FELIZ! Sim, houve alturas em que pensei que nao voltaria a
ser. Mas depois de lambidas as feridas todas, de mais umas quantas quedas (sim, eu
tenho tendecia para cair) o levantar foi qualquer coisa de enorme.
Pode parecer que te estou a esfregar na cara a minha felicidade. Talvez. Nao sei. É provável. Nao que queira ser mais que tu. Talvez seja apenas o bom sabor da vitória. O "consegui!" que durante tanto tempo achei que nao me estava destinado.
E das nuvens
onde vivo, olho para baixo (ou para trás, como quiseres) e sei que já nao faz
mal. Que já nao doi. E que te perdoei (mais ou menos). E que espero que sejas
feliz. Nao porque ache que merecas ou porque como sou catolica deva sentir
assim. Só porque sim.
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